sábado, 3 de maio de 2008

Antropomorfismo Divino parte 2

Assim passaram-se as primeiras Eras do Universo; Deus, maravilhado consigo mesmo ao ver suas pequenas sombras atuarem seus mais magníficos feitos até então - sua perambolagem sem norte pelo nada, a criação do universo vazio e a aparição do ser revolucionário ao próprio Criador, o espelho -, passava sua alvorada eterna numa contemplação nova e viciante. Era rejuvenescedor admirar a si mesmo em sua inocência romântica, perturbador rever seu desespero cego e aconchegante vivenciar novamente a solução da primeira questão divina. Surpreendia-se a cada dia consigo mesmo desde que deixou de sê-lo. Só o restava bradar:

- Ó, Eu! Como é bom ser eu mesmo sem precisar me esforçar para sê-lo.

Porém, começara a perturbar Deus certa angústia - sempre presente mas recentemente relevante - na fonte de sua essência infinita. Ele sabia que algo estava por vir, inquietante e renovador; mesmo reconhecendo a legitimidade de sua força, este o incomodava infinitamente. Percebeu, em seguida (mas antes mesmo do Tempo), a carência de certa criatura num ponto remoto de seus domínios. Uma sombra jovem tentava frustadamente rasgar o tecido da realidade por Deus talhado. Imediatamente, pô-se Deus em total atenção à atrevida e interessante criatura. Em respeito à privacidade do ser, preferia comunicar-se como faziam os seus irmãos, não invadiu o coração nem violou a essência daquele a quem nomeou Diabo:

- O que estás a fazer, pequeno Diabo? - perguntou Deus.

O pequeno ser saltou de espanto como uma criança pêga de surpresa pelo seu Pai - e de fato era - consciente de tê-lo desobedecido mesmo sem violar regra alguma.
Mas era corajoso o pequeno Diabo, talvez até um pouco além do conveniente, e pôs-se a falar em tom de deboche:

- Não é da sua conta. - e fez uma careta um pouco exagerada, a qual lhe conferia um aspecto inverso àquele de sua intenção. Deus riu pela primeira vez.

Pulemos este diálogo entediante entre Pai e filho, pois todos podem imaginar o que vem em seguida; Deus tomara o Diabo como seu preferido e mimara-lo além dos limites por ele mesmo estabelecidos e retraçados, por vezes e mais vezes, até desistir em controlar o pequeno rebelde inconveniente em que se tornara o, como ficaria conhecido, Ser das Trevas. Foi assim nomeado pelos seus amigos graças às famosas festas em seu nome nos confins do universo, sob os domínios onde Deus costumava guardar em segredo seus medos e delírios do próprio poder sobre si. Foi pego de surpresa - pela segunda e última vez - por seu Pai enquanto este emergira numa profunda reflexão sobre si mesmo com o objetivo de detectar uma perturbação em partes de sua personalidade as quais, ultimamente, tomara profundo desgosto. Eram estas a origem da luz turva e curva que tocaram a face de um espelho mal posicionado há eras atrás, essência do Diabo. Não incomodava a Deus a libertinagem do filho, mas sim, a corrupção de seus irmãos. Desde as festas do Diabo, Deus percebera uma atitude evasiva de seus filhos prediletos; não se incomodava com a ausência dos demais - nunca se importara-, mas seus passatempos preferidos estavam evitando-o e não poderia suportar a solidão mais uma vez; seria doloroso demais. Ao descobrir o motivo do recente desprezo dos seus filhos para com a sua presença, foi ter com o Diabo:


(...)

Um comentário:

  1. meio vazio isso aqui... acho q uma campanha publicitária cairia bem...

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