quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

João

João está embaixo do carro, no escuro, cercado por metais imundos e contorcidos. O óleo pingando em seu corpo e o chassi gelado abraçando sua pele. Enquanto isso seu filho dorme na casa da tia, sonhando com o videogame que vai pedir de Natal. também sonha que está espancando a coleginha de classe que resistiu em abaixar a calcinha para ele ver a "rachinha" dela. João não sonha, pois está debaixo de um carro.

A pele de João transpira o tempo, e a vida escapa pelos poros. A pele precocemente enrugada agradece o aconchego daquela caverna. Não quer sair debaixo do carro. E nem pode. Sua mulher, no entanto, está na rua, desfilando o ego debaixo do Sol. pouca roupa. Entra num motel e brinca de mostrar a "rachinha"; o jovem rapaz pergunta o que aquilo siginifica. Ela o chama de "filhinho" enquanto ele a maltrata por trás.

João chora pela morte de seus pais. Ali embaixo lembra um caixão que o fez lembrar o cemitério, que o fez lembrar seus pais num caixão entrando no cemitério. Muita gente em volta, não conhecia um terço. Não chorou naquele dia, mas agora chora. "Sempre atrasado, pensa". Atrasado; o cumprimento de todos os dias que recebe do seu chefe, um porco imundo dono da máfia das vãs. Aquelas mesmas vãs sob as quais têm que se deitar, deixando elas o possuirem, o esmagarem com seus corpos rancorosos e urinarem sob sua face.

João morreu quando foi promovido a motorista. Atropelou a mulher quando a viu sair com outro homem dum motel barato no centro do Rio.

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