sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A simbologia não tem fim

Resolvi falar do amor de escrever. Porque todo amor é uma entrega. Uma entrega sem a dádiva de ter para si, porque a ilusão da posse só existe num tipo de amor. Estou falando do amor tudo, amor todo. Esse que é difícil até de imaginar. O amor ser. Porque, no fundo, a gente só é. Achar que é alguma coisa já não é mais ser. Porque aí vem a dúvida, vem o não-ser; aquilo que não sou. E me vou para fora de mim. Se o mim é o fora, se o fora é o mim, faz parte do que sou. Pra que dividir, segmentar? Só porque tenho na pele o estigma da alma de não entender o que já é? Talvez sejam apenas palavras vazias e confusas. Mas é assim que se libertam de mim. Escrever, o amor de se libertar.

Eu entrego, sem amor, apenas sou a entrega. Das palavras amigas, bondosas e até mesmo inimigas aos olhos do leitor. Sou o que se despede da palavra e aquele que a abraça como num reencontro de um velho amigo ou amor perdido, reatado. Perdido só para o corpo, vale saber. Porque é esse que se ilude, se confunde. A alma não, vagarosa, viaja por aí, se abraçando, se olhando, se beijando. Na pedra, na dor, na morte, no nascimento, no parto de um livro, na história, numa canção.

Acabei de ver uma peça, estou nela ainda, carrego comigo nessa viagem de dadas as mãos. Pois num só corpo, num só espírito que é de mudança, de eterno devir. Carrego comigo o que não é de mim, mas o que sou.

Uma criança perguntou a um senhor de meia idade qual era o sentido da vida. Ele apontou para frente, depois pra trás, pros lados e pra si. Tão perplexo com a pergunta quanto com a reação, quedou-se aos pés do menino e o agradeceu por te-lo encontrado. A quem? o menino perguntou.
A mim. disse o profeta de barba branca e chapéu rosé.

Um comentário:

  1. Nossa, texto perfeito.
    Parabéns, moço.
    És dono de uma grande sensibilidade, e isso é raro hoje em dia.
    Beijos, da Pam.

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